Diversidade no Congresso torna cobertura menos tensa
- Marina Mann
- 29 de nov. de 2021
- 5 min de leitura
Atualizado: 14 de fev. de 2022
Reportagem: Marina Mann

Os repórteres de política que atuam principalmente em Brasília vêm sofrendo muitos ataques durante as coberturas, enquanto estão cumprindo seu trabalho. Sabemos pouco sobre esse processo. Muitas dessas intolerâncias são explicitadas na mídia, porém, a maioria delas ocorrem sem que sequer tenhamos conhecimento. No Congresso, entretanto, os jornalistas apontam ser diferente, pela grande diversidade. Os ataques aos jornalistas não se apresentam de forma pessoal. Apesar disso, outros entraves são apontados.
A jornalista Bárbara Baião da CNN afirma que a convivência acaba naturalizando o conflito. Os jornalistas passam tanto tempo no congresso, que acabam virando parte daquilo. Então, mesmo que os políticos não queiram falar, eles não vão ser intolerantes. Ela declara que foi se impondo ao longo do tempo e conquistou respeito e espaço. Bruno Góes, jornalista do O Globo, diz que o Congresso tem uma diversidade muito grande de pessoas, que pensam muitas coisas diferentes e que foram eleitas para realmente representar alguém. Com isso, afirma não achar que essa intolerância se intensifica pelo ambiente do Congresso. "A intolerância existe, assim como existe em qualquer outro lugar da sociedade", declara. Para ele, é um reflexo do corpo social.
De forma geral, os deputados, senadores e ministros têm uma relação cordial com a imprensa, mas algumas vezes, não respondem da maneira desejada por conta de ideias pré concebidas. A repórter Natália Portinari comenta que é difícil que se neguem a conversar em um primeiro contato. Entretanto, com fontes que têm uma relação mais frequente, se algo que ela escreve os desagrada, é comum que não queiram mais falar. Ela não atribui essa ação a um determinado clima político, e sim a uma natureza própria do jornalismo. Dificilmente uma matéria publicada agrada a todos, principalmente pelo fato de terem muitos interesses em jogo e o jornalista não estar lá para agradar ou favorecer determinada pessoa, mas sim, publicar o fato. Bruno lembra que o nosso trabalho é falar com todo mundo, não importa quem está ali. O que o jornalista escreve precisa ser real, independente da opinião do parlamentar.
Natália também ressalta que a velha política estava mais adaptada a entender a imprensa como uma função essencial do mandato. Falar com o jornalista era uma obrigação. Todavia, muitos dos novatos que entraram na nova leva, da extrema direita, não entendem dessa forma. Eles lidam com a imprensa de forma diferente, porque eles pensam ter uma auto-suficiência no Twitter, então não precisam dos meios para se comunicar com o seu eleitor. Ela reflete que ser jornalista é ter o posicionamento político de que o jornalismo tem que existir. É se manter acreditando que o jornalismo profissional ainda é muito importante e que o fato sempre se impõe.
O coordenador do jornal O Globo em Brasília, Francisco Leali, acrescenta que os políticos estão acostumados a lidar com os jornalistas, mas mesmo assim, quando é algo contra eles, dizem que o jornalista está ali para mentir. Se a matéria for contra o inimigo dele, o jornalista fez um trabalho sensacional e ainda usa para falar mal desse inimigo. Na maioria das vezes, as matérias estão certas e quem o conteúdo incomodou diz que é um problema. É importante saber que nesse jogo político não tem fonte desinteressada. Toda fonte está passando a informação para o jornalista com um interesse específico.
O aumento da intolerância quando mulheres noticiam e Fake News
Nessa perspectiva, vemos que o papel da imprensa vem sendo questionado diversas vezes pelas autoridades. Existem diversas situações em que a política coloca em xeque a função da imprensa: por não estarem acostumados a essa abordagem; por usarem o seu discurso para forçar as próprias crenças e não depender dessa interlocução para se comunicar; alguns que a respeitam; e tem quem entenda perfeitamente o papel da imprensa e utilize dele para se promover ou enganar alguém. Bruno fala que o conceito da imprensa foi depreciado, porque isso faz parte do discurso político que ganhou adesão e voto atualmente. O jornalismo vem perdendo relevância para a Fake News. É preciso uma mobilização do discurso político para que as pessoas respeitem o papel da imprensa e entendam que não podem acreditar em qualquer coisa, porém é um longo trabalho.
Bárbara concorda em vários pontos com a fala do jornalista do O Globo e complementa que fazer jornalismo é ser oposição o tempo todo, independente do governo. É preciso responder a essas notícias falsas com mais jornalismo, é sempre uma relação de muito tensionamento, mas aos poucos as pessoas vão se dando conta de que o jornalismo profissional é fonte segura de informação. Liberdade de expressão não pode ser confundida com a liberdade de sair xingando as pessoas, você precisa ter responsabilidade.
Esses ataques são direcionados à imprensa de uma forma geral, mas atinge de um jeito diferente as jornalistas mulheres. Danielle Brant, jornalista da Folha de S. Paulo, afirma que o Congresso reproduz a estrutura machista da sociedade. Muitos desconsideram as mulheres como pessoas que têm capacidade de fazer um trabalho sério, assim como os homens. E, ainda, tem a soberba de achar que gênero define se é mais inteligente ou não. É importante colocar limites nos comportamentos no dia a dia.
Por conta desse panorama, os veículos de comunicação estão mais atentos e cautelosos em respeito a vida dos jornalistas. Francisco relembra que desde as manifestações de 2013 já existe esse alerta em relação até onde pode avançar sem comprometer a segurança. Hoje em dia, eles trabalham com o crachá escondido no bolso, preferem não se identificar. Os repórteres que aparecem no ao vivo raramente se expõem no meio da confusão, na maioria das vezes é um produtor, com um celular, sendo o mais discreto, para continuar passando a informação em segurança. A repórter da CNN conta que os veículos como um todo tem essa regra, por tudo que já passaram, tem um limite até onde avançar. É preciso preservar a segurança e integridade dos jornalistas. Esse cuidado tende a se repetir ano que vem. Não há nada que vale arriscar a segurança que não dê para apurar depois.
Pandemia e as eleições de 2022
Leali analisa que a pandemia está sendo um parêntese na cobertura jornalística, tudo ficou mais difícil. Não é possível cobrir política a distância, precisa ter contato pessoal com as fontes. Esses encontros e trocas são importantes para ter informações diferentes. Apesar das dificuldades, o jeito de apurar não mudou. A diferença é que o país está polarizado e nem sempre um lado entende o trabalho do jornalista, o vê como um inimigo.
Como uma projeção para o próximo ano, o coordenador do jornal O Globo, avalia que a cobertura do ponto de vista dos jornalistas, vai ser bem difícil, e vai estar relacionado ao quão disputada vai ser a eleição. Se o Bolsonaro tiver bem nas pesquisas e com chance de ganhar, acredito que o repórter que vai cobrir ele nos grandes jornais, vai estar em uma situação difícil e talvez até em risco. E em relação aos outros candidatos, com exceção do Lula que já tem um eleitorado consolidado, vai ter um terceiro ou vários terceiros querendo roubar o lugar de um dos dois. Mas esses ele não vê como um desafio para o jornalista, porque eles vão estar interessados em aparecer, em dar entrevista, não vai ser uma cobertura que você precisa usar colete a prova de bala. O cenário desenhado pelo governo atual em relação aos jornalistas não é nada animador.
Em suma, o Congresso não é um lugar potencializador dessa intolerância. Muitos desses preconceitos estão enraizados na sociedade, portanto, também se repetem no âmbito político. Isso não é motivo para não continuarmos atentos e procurando tornar um ambiente mais saudável e respeitoso sempre. É importante ressaltar que cobrir política é descobrir aquilo que não estão te dizendo, o que não se quis falar e porquê. É ouvir todos os lados e contar uma história. Com isso, é importante manter o jornalismo profissional vivo, para que cada vez mais o fato vá ganhando relevância sob quem o está contando.
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